CAMINHANTE NÃO HÁ CAMINHO [1]
Tudo passa e tudo fica
Mas o nosso é passar
Passar fazendo caminhos
Caminhos sobre o mar
Nunca persegui a glória
Nem deixar na memória
dos homens minha canção
Eu amo os mundos sutis
Sem gravidade e gentis
Como bolhas de sabão
Gosto de vê-las pintar-se de sol e grená, voar
debaixo do céu azul, tremer subitamente e quebrar-se Nunca persegui a glória Caminhante, são tuas pegadas o caminho e nada mais Caminhante, não há caminho, se faz caminho ao andar Ao andar se faz caminho e ao voltar a vista atrás se vê a senda que nunca se há de voltar a pisar Caminhante não há caminho, senão sulcos no mar Há algum tempo neste lugar onde hoje os bosques se vestem de espinhos ouviu-se a voz de um poeta gritar “Caminhante não há caminho se faz caminho ao andar” Golpe a golpe, verso a verso Morreu o poeta longe do lar cobre-lhe o pó de um país vizinho Ao afastar-se viram-no chorar “Caminhante não há caminho, se faz caminho ao andar…” Golpe a golpe, verso a verso Quando o pintassilgo não pode cantar Quando o poeta é um peregrino Quando de nada nos serve rezar “Caminhante não há caminho, se faz caminho ao andar…” Golpe a golpe, verso a verso.
“Caminante no hay camino” é uma de minhas poesias preferidas através da qual me permito o prazer de imaginar as bolhas de sabão, os caminhos no mar e talvez a brisa suave que acariciou o rosto de Machado enquanto ele fazia este poema nascer.
Quem ama poesia geralmente tem o hábito de buscar, não explicá-las, mas senti-las naquilo que está além das palavras. No pequeno espaço em branco, o vazio entre duas palavras ou da respiração de uma pausa, cabe um universo inteiro.
Aqui compartilho o excerto de uma análise que me pareceu bastante coerente:
“Em resumo Machado nos diz que cada pessoa há de encontrar o seu caminho “Caminhante não há caminho”, que terá que decidir-se a recorrê-lo, ainda com a incerteza do que acontecerá, e que não voltaremos a recorrer os caminhos já vivenciados. E em todo caso, ao final dos nossos dias ficarão as recordações do vivido (sulcos no mar)".
[1] Livre tradução de Patrícia Rios.